Roteiro: "Nas margens do Douro - A História da Real Companhia Velha"
No âmbito das comemorações do Dia Internacional dos Monumentos e Sítios de 2021, o Museu da 1ª Demarcação lança este roteiro digital. Composto por várias localizações e edifícios relevantes que retratam a História secular da Real Companhia Velha, este roteiro convida todos os interessados a conhecer o percurso histórico da Companhia edificado nas margens do rio Douro.
Reúna a família nestes dias primaveris e venha desvendar alguns dos locais mais emblemáticos da Real Companhia Velha, em ambas as cidades (Porto e Vila Nova de Gaia). Aconselhamos o uso de vestuário e calçado adequado a todos os participantes. E informamos que o percurso apresentado poderá ter início na sede da Real Companhia Velha (percurso com menor índice de elevação) ou no Museu da 1ª Demarcação (percurso onde o índice de elevação será superior). Boas descobertas!
Nota: Atualmente e devido à situação epidemiológica, ambos os espaços da Real Companhia Velha encontram-se temporariamente encerrados ao público.
Distância total do percurso.
Aproximadamente 7km
Duração média
Entre 1:25h (percurso a pé) a 2:00h (com paragens nos vários pontos de interesse)
Dificuldade.
Fácil a Moderado (dependendo da forma física)
Real Companhia Velha
Bem-vindos à Real Companhia Velha, também designada inicialmente por Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro. Este roteiro tem início na fachada do edifício onde se localiza a atual sede da Companhia. O edifício pertence à empresa desde 1972, ano em que ocupa as instalações da Real Companhia Vinícola do Norte de Portugal. Em 1973 a empresa centraliza aqui toda a sua atividade.
A extensão geográfica deste complexo é de 20.000m2, sendo composto por um edifício dedicado a escritórios, departamento técnico, área de receção a visitantes (onde se iniciam as visitas às famosas Caves de vinho do Porto) e 2 armazéns dedicados ao envelhecimento de vinhos.
Atualmente, a Real Companhia Velha destaca-se por ser uma das principais empresas no setor da produção e exportação de vinhos.Estando presente, não só no mercado interno, mas também em 50 países pelo Mundo. Para além da sede, a Companhia abriu em 2018, o Museu & Enoteca 17.56 (Museu da 1ª Demarcação – onde termina este percurso) e detêm ainda 5 quintas na Região do Alto Douro Vinhateiro (contabilizando mais de 500 hectares de vinhas próprias).
Vamos continuar a desvendar a História desta que é considerada a empresa mais antiga de vinhos de Portugal, com atividade ininterrupta ao longo de mais de 265 anos de História. Tendo sido instituída por alvará régio do Rei D. José I, a 10 de Setembro de 1756.
Painel publicitário – “Real Vinícola”
Chegado agora ao segundo ponto deste roteiro poderá contemplar o painel publicitário em azulejo com indicações para visitar a “Real Vinícola”. Como referimos anteriormente, a Real Companhia Velha transferiu-se para esse complexo industrial em 1972. Este local que acabamos de visitar anteriormente pertenceu à Real Vinícola, que desde 1889 instalou aí a sede dessa empresa. De salientar que em 1963, esta empresa foi absorvida pela Real Companhia Velha, num período de forte expansão empresarial.
Apesar dos diversos períodos mais conturbados que marcaram o percurso histórico da Real Companhia Velha, o seu caminho foi marcado por grandes progressos e por importantes obras públicas, que conheceremos mais à frente. Em pleno séc. XX, Manuel da Silva Reis adquire as primeiras ações da Companhia, em 1955. Dois anos mais tarde, assume a direção da empresa ao adquirir a maioria do capital da Real Companhia Velha. Durante o seu mandato (o mais longo da História desta empresa) a Real Companhia Velha cresce e consolida a sua posição empresarial. Neste panorama entre 1960 e 1973 adquire várias empresas do setor, aumentando o seu património e a sua atividade. Durante esta fase, a Companhia aposta também em métodos inovadores de produção, modernizando a empresa e aumentando o seu capital. Tornando este num dos períodos de maior crescimento e dinamismo da Real Companhia Velha.
Reitoria da Universidade do Porto
Para quem já visitou o Museu da 1ª Demarcação, este ponto no roteiro não é uma novidade, contudo para a maioria da população este é um facto totalmente desconhecido. A Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro, executou diversas obras públicas, não apenas no Alto Douro Vinhateiro, como também na própria cidade do Porto. Entre diversos empreendimentos, a Companhia desempenhou um papel vital ao alicerçar as origens do ensino superior técnico, no Porto.
Em 1762, a Companhia implementa a Aula Náutica, que serviria para preparar os oficiais que tripulavam as fragatas do Porto, tanto para a proteção da costa portuguesa, como dos navios que seguiam para o Brasil. Posteriormente, em 1779 cria-se também a Aula de Debuxo e Desenho, onde constavam cursos de pilotagem, comércio e indústria. Anos mais tarde, em 1803, a Companhia implementa na cidade do Porto a Academia Real de Marinha e Comércio, no local onde hoje se encontra a Reitoria da Universidade do Porto. Aqui eram ministradas diversas aulas oficiais: comércio, matemática e línguas. Por esse motivo competia à Junta da Companhia a inspeção deste estabelecimento de ensino. Em 1837, a Academia sai da alçada da Companhia e é transformada em Academia Politécnica. Já no século XX, em 1911 a Academia Politécnica funde-se com a Escola Médico-Cirúrgica dando origem à Universidade do Porto.
Antiga Casa da Companhia
Estamos agora a meio do nosso roteiro histórico e neste momento encontramo-nos na antiga e primeira sede da Companhia, ainda hoje designada por “Casa da Companhia”. Este edifício do séc. XVI inicialmente de cariz habitacional, localiza-se em plena Rua das Flores. Tendo sido mandado edificar com as características arquitetónicas que conhecemos atualmente, por Francisco Neto de Figueiroa. A Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro aluga essa casa entre 1756 e 1805, altura em que adquire o imóvel. Tendo estabelecido aí a sua sede, mais concretamente a “sua casa de despacho, secretaria, contadoria e escriptório”.Aqui ficaria então localizada a sede da empresa até ao ano de 1961.
Como vimos anteriormente, a Real Companhia Velha foi fundada pelo rei D. José I e por esse motivo tratava-se então de uma companhia majestática, com diversos privilégios e poderes públicos. Sendo uma instituição dependente diretamente do rei, era assim independente dos tribunais, tendo foro próprio através do seu Juízo da Conservatória. Estava também dotada com funções públicas de regulação da produção e comércio dos vinhos e fixação de preços, com poderes de polícia administrativa. Estes privilégios e poderes mantiveram-se inalterados entre 1756 e 1834, ano em que a instituição perde todos os privilégios que detinha.
A sua origem teve como base a conjuntura económica e política do país em meados do século XVIII. Nomeadamente a crise económica relacionada com a exportação do vinho do Douro, assim como a reorganização económica e mercantil levada a cabo pelo Marquês de Pombal. A Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro foi constituída na sua génese por um conjunto de acionistas compostos pelos Homens Bons da cidade do Porto e pelos principais agricultores da região do Alto Douro.
Antigos Armazéns da Companhia
Considerando que a Real Companhia Velha deteve um papel tão destacado em termos de exportação do vinho do Porto e do Douro, a empresa detinha diversos armazéns tanto nas margens de Vila Nova de Gaia, como na cidade do Porto. Como é o caso deste edifico, inicialmente um antigo armazém da Companhia e atualmente, ocupado pelo Consulado da Embaixada da Estónia, no Porto.
Uma das medidas estabelecidas pela Companhia era a aquisição de vinho para regulação do mercado, possuindo ainda um direito de primazia na compra dos referidos vinhos. A Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro detinha ainda o direito exclusivo no fornecimento de vinho às tabernas do Porto e arredores, assim como de produção e venda de aguardentes no Porto e Norte. Em termos de exportação comercial também eram inúmeros os seus privilégios, enquanto companhia majestática. Tendo nomeadamente, o exclusivo do comércio de vinhos, aguardentes e vinagres com o Brasil, até 1777. Deste modo, o Brasil foi um dos mais importantes mercados internacionais para o vinho do Alto Douro (posição que mantêm até aos dias de hoje). Igualmente relevante era o comércio com a Inglaterra, no século XVIII. Já em 1779, a Companhia alarga os seus negócios à Rússia e Estados Bálticos e nos séculos XVIII e XIX, chegou a exportar para os recém-formados EUA e para outras partes do mundo.
Cais de Gaia
Tendo percorrido a zona da Ribeira, alcançamos agora um local com uma paisagem memorável, na combinação de um rio emblemático e de duas cidades que cresceram e prosperaram nas suas margens.
Como fomos referindo ao longo deste roteiro, a Companhia Geral da Agricultura dos Vinhos do Alto Douro levou a cabo diversas obras públicas, não apenas de âmbito académico, mas também em termos de transformação do território. A principal obra foi destacadamente a Demarcação do Alto Douro Vinhateiro (a qual vamos abordar no próximo e último ponto deste roteiro). Contudo, muitas outras obras públicas foram levadas a cabo, tendo em vista o desenvolvimento da região, da cidade do Porto e do próprio vinho produzido no Douro. No âmbito da navegabilidade do Rio Douro, a Companhia procedeu à destruição dos numerosos nasceiros e pesqueiros, inclusive do famoso cachão da Valeira, possibilitando assim a navegabilidade do rio Douro desde a fronteira com Espanha, até à foz. A empresa também superintendeu as obras da barra do Douro e a construção do cais ao longo do rio. Tendo construído diversas estradas no Alto Douro e a estrada marginal do Porto à Foz. Foram também erguidas pontes e armazéns, tendo legado a toda a região, diversas infra-estruturas fundamentais para o seu desenvolvimento económico, social e educativo.
Museu da 1ª Demarcação
Este Museu inserido no espaço Museu & Enoteca 17.56, foi criado em 2018 pela Real Companhia Velha, enquanto um lugar de partilha e memória da história desta empresa secular. A combinação entre o restaurante no 1º piso e o Museu no rés-do-chão conferem a este espaço um conceito único, onde a gastronomia encontra-se aliada à cultura, sendo atualmente um ponto de referência na cidade de Vila Nova de Gaia, apresentando assim uma oferta diferenciadora na região.
O Museu foi erigido no edifício da antiga sede da Real Companhia Velha (aqui localizada entre 1961 e 1972) e onde também se encontravam alguns dos seus armazéns. Por este motivo, a escolha deste local não foi aleatória, tendo como objetivo a promoção do património edificado e a História da empresa. A exposição permanente patente no Museu da 1ª Demarcação está dividida em 7 núcleos distintos que abordam estas e muitas outras temáticas relacionadas com a História desta empresa e do seu papel na região envolvente. Contudo o seu foco primordial é a principal obra levada a cabo pelo Companhia e o seu objetivo basilar, a Demarcação da Região do Douro e desta forma a regulamentação da produção e comercialização do vinho do Porto. Esta obra de grande envergadura decorreu em várias fases: Demarcação Pombalina e Demarcação Mariana. Ao longo do tempo foram preservados registos documentais, mapas, marcos de feitorias, e todo um acervo diverso que exposto, preservado e estudado, nos demonstra o inestimável valor patrimonial da Real Companhia Velha tanto na proteção, como na regulação e na salvaguarda de uma área que é hoje considera Património Mundial da Humanidade, o Alto Douro Vinhateiro.
Ao concluir este roteiro pelos recantos do percurso histórico aqui apresentado, certamente desvendou vários factos, locais e obras que demonstram a importância da Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro, também (e hoje) conhecida como Real Companhia Velha. Esta Ex-majestática Companhia deteve um papel determinante para a prosperidade económica, influência política, prestígio social e cultural da cidade do Porto e restantes áreas geográficas envolventes. A Real Companhia Velha ao dotar a cidade e a região das diversas infra-estruturas que descobrimos ao longo do roteiro atribuiu uma identidade única a toda esta área geográfica e ao próprio Alto Douro vinhateiro. O qual o convidamos a descobrir brevemente.